A Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro analisou
107 processos em tramitação nos tribunais do júri fluminense, que julgam casos
de atentado contra a vida, e traçou panorama das mulheres vítimas de
feminicídio ou de tentativa de feminicídio no estado. A pesquisa analisou casos
de mulheres entre 21 e 40 anos, a maioria atacadas em casa pelo companheiro ou
ex-companheiro. O levantamento foi divulgado hoje (6) no contexto do Dia
Internacional da Mulher, lembrado no domingo (8).
Segundo a pesquisa, uma em cada três agressões é atribuída,
pelo autor do crime, à dificuldade em aceitar o fim do relacionamento. Outros
motivos foram discussão por razões diversas, vingança, ciúme, estupro e recusa
da vítima em manter relação sexual.
A maior parte dos crimes ocorreu entre pessoas que
namoravam, estavam casadas ou vivendo em união estável (40%) ou tinham uma
relação anterior (42%), sendo que 62% dos relacionamentos eram de até cinco
anos. Quase todas as mulheres foram submetidas a episódios anteriores,
registrados ou não em delegacia, de violência doméstica. Segundo o estudo,
muitas não denunciaram os agressores por medo ou porque foram coagidas por
eles.
A maioria dos crimes ocorreu de noite (39%) ou de madrugada
(34%). Juntos, observa-se que 73% dos crimes foram praticados no período de
descanso. Além disso, em 72% dos casos, a agressão ocorreu na residência da
vítima. Os autores utilizam, em 44% dos casos, uma faca para cometer o crime,
seguida da arma de fogo (17%).
O trabalho consistiu na leitura e análise documental de
processos sobre o assunto. Dos 107 processos estudados, ajuizados entre 1997 e
2019, 40 foram julgados, dos quais 31 terminaram em condenação. No total, 69
contêm relatos de violência doméstica anterior, apenas 23 dos quais anotados na
folha de antecedentes criminais do autor.
“O que chama a atenção é que vários processos têm relatos de
violência doméstica anterior, mas em muito poucos foi acionada a polícia ou
houve o registro de ocorrência dessas violências anteriores. A gente tem que
procurar entender por que tantas mulheres ainda vivenciam o ciclo da violência,
mas não se socorrem das medidas protetivas de todo o sistema que a Lei Maria da
Penha oferece para prevenir um fato mais grave”, disse a coordenadora de Defesa
dos Direitos da Mulher da Defensoria, Flavia Nascimento.
De acordo com a defensora pública, é preciso investir mais
na qualificação e sensibilização dos profissionais que atuam na rede de
proteção à mulher nos sistemas de justiça e de segurança pública para as
questões de gênero.
Segundo Flavia, a dificuldade em intimar o réu é um dos
motivos para o atraso nos julgamentos, mas a maior demora para a conclusão dos
casos ocorre ainda na fase de inquérito policial. “Isso contribui para que a
mulher desacredite no sistema de justiça como uma das alternativas para a solução
do seu problema de violência doméstica”, acredita.
Para a diretora de Estudos e Pesquisas de Acesso à Justiça,
Carolina Haber, coordenadora da pesquisa, o ciclo de violência atinge
principalmente mulheres muito vulneráveis, vivendo em áreas carentes, com forte
relação de dependência econômica com o agressor.
“O que o poder público tem que fazer é dar condições para
que a mulher se sinta acolhida num primeiro momento. Se ela não chega a fazer
registro na delegacia é porque, de fato, ela não vê o Estado como passível de
prover uma política pública que dê acolhimento”.
Fonte: Notícias ao Minuto
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